sábado, 20 de junho de 2009

Um dia desses tava reclamando (de novo pra mim mesma - e faço isso muito) que não conseguia mais escrever. Não saía, sabe, não fluía. Ainda não flui. Dai tava aqui sem fazer nada e resolvi ler um pouco mais de Caio (porque ele sim flui que é uma beleza) e a carta dele pro Zezim diz o seguinte: 'Essa perguntinha: você quer mesmo escrever? Isolando as cobranças, você continua querendo? Então vai, remexe fundo, como diz um poeta gaúcho, Gabriel de Britto Velho, "apaga o cigarro no peito / diz pra ti o que não gostas de ouvir / diz tudo". Isso é escrever. Tira sangue com as unhas. E não importa a forma, não importa a "função social", nem nada, não importa que, a princípio, seja apenas uma espécie de auto-exorcismo. Mas tem que sangrar a-bun-dan-te-men-te. Você não está com medo dessa entrega? Porque dói, dói, dói. É de uma solidão assustadora. A única recompensa é aquilo que Laing diz que é a única coisa que pode nos salvar da loucura, do suicídio, da auto-anulação: um sentimento de glória interior. Essa expressão é fundamental na minha vida.' Talvez - e eu digo talvez porque atualmente tenho receio de fazer qualquer afirmação fatal, que não conste um pouco de dúvida - talvez eu tenha medo, mesmo. Porque dói, dói, dói. Melhor deixa lá guardadin porque daí não dói tanto, sabe. Dói só um pouco, internamente. Mas de repente explode e já era, sai tudo em vômito de palavras, em choros desperados, em ligações que não deveriam ser feitas, sentimentos tão controversos que não deveriam ser expostos. Mas, uma hora ou outra, sempre são. Ele fala na carta de escrever sobre "as vontades mais homicidas, o aparentemente inconfessável, as culpas mais terríveis". Acho que ainda não tou pronta pra repetir as minhas vontades que são frequentes e não passam, pra confessar tais sentimentos, nem tenho paciência nem folêgo para me culpar por nada. Não quero sua desculpa, nem aprovação, poupe-me de seu perdão.

Ele diz, ainda na mesma carta, que conheceu Clarice Lispector, que foi por muito tempo a minha musa. E disse que ela era muito infeliz e morreu sozinha, sendo chamada até de "meio doida". Fiquei me perguntando se seria esse meu destino, por sentir demais, sofrer demais, me perder nas palavras, pensamentos, sentimentos: morrer só e incompreendida, como ela. Não que eu esteja me comparando à Clarice Lispector - não chego nem aos pés da genialidade dela - mas tem algo nela que diz muito, muito sobre mim.

Logo depois que eu escrevi sobre vomitar o que se escreve, encontrei o Caio, de novo, falando com o Zezim: "Pra mim, e isso pode ser muito pessoal, escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor. Mas o momento decisivo é o dedo na garganta. E eu acho — e posso estar enganado — que é isso que você não tá conseguindo fazer. Como é que é? Vai ficar com essa náusea seca a vida toda? E não fique esperando que alguém faça isso por você. Ocê sabe, na hora do porre brabo, não há nenhum dedo alheio disposto a entrar na garganta da gente". Como se estivesse me dizendo: toma coragem, vai lá, mete o dedo, passa mal e vomita. Não quero ficar com essa náusea seca pra vida toda, não quero não.

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