segunda-feira, 22 de junho de 2009

esse jeito irritantezinho

L diz:
até quando eu tava subindo as escadas, pensei "ela tem esse jeito levemente irritantezinho, mas me deixou alegre, já"
L diz:
fiquei alegre de ter conversado contigo, mas nem é por nada dito, é mais pela troca.
L diz:
irritantezinho no bom sentido.
mayah diz:
a gente é bom nisso de trocas, né
mayah diz:
a gente troca bem as coisas em pouco tempo
mayah diz:
enquanto eu conversava contigo eu pensei que perto de ti eu não sou tão impenetrável assim
L diz:
ah, que bonito isso.
mayah diz:
me explica o irritantezinho
L:
mas é, a gente troca rapidamente, daí não perde tempo e vai falar direto do Grande Medo.
L:
que é o que nos une.
L:
tá, o irritantezinho é esse teu jeito de querer parecer mais alegre, mais forte, mais bem-resolvida, mais descolada até, do que eu sei que é.
L:
mas eu não caio.
L:
mas tu sabe que eu não caio.
L:
daí a gente se entende.


Pra ele que não cai, que me desvenda e me desnuda tão naturalmente que eu sequer consigo evitar, fugir, disfarçar. Ele que com aqueles olhos azuis - da mesma cor do céu das tardes quentes daquele melhor verão - consegue ver através de mim, enxergando o que tento esconder no lugar mais escuro e profundo do meu corpo, alma, coração. Ele que nos encontrões em corredores, entradas e saídas de aula, em trocas de sorrisos, abraços e meias frases e palavras inteiras como se fossem selecionadas para um roteiro pré-determinado, consegue ajudar a desvendar um pouco mais de mim, no meio dessa bagunça que é viver.

sábado, 20 de junho de 2009

Ainda sobre escrever:

Falando com o Z - uma dessas pessoas iluminadas que tu vê de longe que é do bem e que sente como poucos - nas raras (infelizmente) conversas que temos, ele comentou sobre a música que ele compôs (que é uma das coisas mais lindas que eu ouvi nos últimos tempos). Disse que não tinha sido ele quem a fez, que ele pegou ela por aí, no ar. Achei tão bonito. E o especial é que não é uma daquelas frases de efeito. Ele realmente deve ter pegado ela por aí, no ar. Li uma vez que nós, seres humanos, fazemos parte do universo e através de nós este tenta se expressar. A evolução não passa do universo buscando a perfeição para expressar a si próprio. Massa, né? Acontece que nos desligamos tanto da nossa origem e somos tão consumidos por outras distrações externas que, destreinados e esquecidos, nem percebemos o que o universo se esforça pra nos transmitir, passamos reto, nem sentimos. Mas o Z, sensível como é, conseguiu pegar essa boniteza toda, pairando no ar.
Segue a letra da belezura aí:

Um Pouco Só

Eu andei me achando um pouco só, um pouco demais
Apesar de quase nunca ter lhe demonstrado
Normalmente me disfarço em linhas feitas pra pensar
Mas isso não quer dizer que eu esteja fugindo

Não importa quanto tempo vai durar
Não nado contra

Prefiro conversar sobre a vida, a paz e a guerra
E como nos sentimos sós quando o vento sopra a vela
Será que nada faz parar todo esse cinza na janela?
Que poe as cores para descansar quando a gente menos espera

Se estamos juntos nessa solidão
Não nade contra

Prefira conversar sobre a vida, a paz e a guerra
E como nos sentimos bem enquanto o vento sopra a vela
E não vai mais poder lembrar daquele cinza na janela.
Por que as cores todas vão dançar enquanto a solidão espera.


P.S.: Depois de postado, lendo aquela mesma carta do Caio F. pro Zezin, ele diz o seguinte: "Às vezes penso que, quando escrevo, sou apenas um canal transmissor, digamos assim, entre duas coisas totalmente alheias a mim, não sei se você entende. Um canal transmissor com um certo poder, ou capacidade, seletivo, sei lá". Caiu feito luva pra esse post aqui.

Um dia desses tava reclamando (de novo pra mim mesma - e faço isso muito) que não conseguia mais escrever. Não saía, sabe, não fluía. Ainda não flui. Dai tava aqui sem fazer nada e resolvi ler um pouco mais de Caio (porque ele sim flui que é uma beleza) e a carta dele pro Zezim diz o seguinte: 'Essa perguntinha: você quer mesmo escrever? Isolando as cobranças, você continua querendo? Então vai, remexe fundo, como diz um poeta gaúcho, Gabriel de Britto Velho, "apaga o cigarro no peito / diz pra ti o que não gostas de ouvir / diz tudo". Isso é escrever. Tira sangue com as unhas. E não importa a forma, não importa a "função social", nem nada, não importa que, a princípio, seja apenas uma espécie de auto-exorcismo. Mas tem que sangrar a-bun-dan-te-men-te. Você não está com medo dessa entrega? Porque dói, dói, dói. É de uma solidão assustadora. A única recompensa é aquilo que Laing diz que é a única coisa que pode nos salvar da loucura, do suicídio, da auto-anulação: um sentimento de glória interior. Essa expressão é fundamental na minha vida.' Talvez - e eu digo talvez porque atualmente tenho receio de fazer qualquer afirmação fatal, que não conste um pouco de dúvida - talvez eu tenha medo, mesmo. Porque dói, dói, dói. Melhor deixa lá guardadin porque daí não dói tanto, sabe. Dói só um pouco, internamente. Mas de repente explode e já era, sai tudo em vômito de palavras, em choros desperados, em ligações que não deveriam ser feitas, sentimentos tão controversos que não deveriam ser expostos. Mas, uma hora ou outra, sempre são. Ele fala na carta de escrever sobre "as vontades mais homicidas, o aparentemente inconfessável, as culpas mais terríveis". Acho que ainda não tou pronta pra repetir as minhas vontades que são frequentes e não passam, pra confessar tais sentimentos, nem tenho paciência nem folêgo para me culpar por nada. Não quero sua desculpa, nem aprovação, poupe-me de seu perdão.

Ele diz, ainda na mesma carta, que conheceu Clarice Lispector, que foi por muito tempo a minha musa. E disse que ela era muito infeliz e morreu sozinha, sendo chamada até de "meio doida". Fiquei me perguntando se seria esse meu destino, por sentir demais, sofrer demais, me perder nas palavras, pensamentos, sentimentos: morrer só e incompreendida, como ela. Não que eu esteja me comparando à Clarice Lispector - não chego nem aos pés da genialidade dela - mas tem algo nela que diz muito, muito sobre mim.

Logo depois que eu escrevi sobre vomitar o que se escreve, encontrei o Caio, de novo, falando com o Zezim: "Pra mim, e isso pode ser muito pessoal, escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor. Mas o momento decisivo é o dedo na garganta. E eu acho — e posso estar enganado — que é isso que você não tá conseguindo fazer. Como é que é? Vai ficar com essa náusea seca a vida toda? E não fique esperando que alguém faça isso por você. Ocê sabe, na hora do porre brabo, não há nenhum dedo alheio disposto a entrar na garganta da gente". Como se estivesse me dizendo: toma coragem, vai lá, mete o dedo, passa mal e vomita. Não quero ficar com essa náusea seca pra vida toda, não quero não.